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"Se existisse um povo de deuses, seria governado democraticamente. Mas um governo assim perfeito não é feito para os homens." (J.J. Rousseau)
Pesquisas recentes mostram que a esmagadora maioria dos brasileiros (75%) é a favor da democracia, enquanto uma minoria de apoiadores do presidente Bolsonaro clama pelo fim dela. O que chama a atenção é que, entre estes últimos, muitos são jovens (como a ativista Sara Winter, que nasceu em 1992) que não eram sequer nascidos à época da ditadura militar. Segundo o IBGE, 54,2% da população brasileira nasceu após o ano de 1985, quando o regime militar terminou. Somando os que eram crianças de até 10 anos nessa data, o percentual sobe para 69,4%. Ou seja, sete em cada 10 brasileiros não viveram a ditadura, ou eram muito jovens para terem fixado na experiência o que foi aquele momento.
Será que os jovens (e não apenas eles!) sabem dar valor para a democracia? Talvez não. Essa dúvida levou o jornal Folha de S. Paulo a criar uma campanha publicitária (final de junho), inspirada na mobilização das "Diretas Já" (1984), em defesa da democracia. Além da publicação do projeto especial "O que foi a Ditadura", o jornal promoveu um curso online gratuito de quatro aulas, de uma hora de duração cada. O pacote tem por finalidade mostrar, sobretudo aos mais jovens, qual era a realidade do período autoritário. A campanha será identificada pela faixa "#Use Amarelo pela Democracia", cor da nossa bandeira apropriada pelos apoiadores de Bolsonaro, mas que vem sendo resgatada por grupos com faixas pró-democracia.
Segundo o pensador italiano Norberto Bobbio, falecido em 2004, no seu livro Liberalismo e Democracia (1994), por "democracia" entende-se uma forma de governo da maioria ou do povo em contraposição ao governo de poucos (autocracia). O que mudou, desde o pensamento político grego, foi a passagem da democracia direta para a democracia representativa, não o titular do poder político, que é sempre o povo. Numa democracia representativa, não cabe ao povo tomar ele mesmo as decisões que lhe dizem respeito, mas elege seus representantes que devem por ele decidir.
A implantação da democracia representativa, antes de tudo, decorre de uma razão prática: o tamanho dos Estados modernos. Além disso, há os que acham que os representantes eleitos estariam em condições de avaliar os interesses gerais melhor que os próprios cidadãos, geralmente concentrados nos seus interesses particulares. Afinal, os políticos são pagos para isso! Porém, como garantir que, depois de eleitos, os representantes não traiam os representados? Isso, de fato, acontece. Pode ser positivo, na medida em que o eleito se desvincule do interesse particular do eleitor e passe a defender os interesses da nação inteira. É negativo quando o eleito vota a seu próprio favor ou de interesses de grupos (evangélicos, ruralistas, "centrão", etc.).
Autores do séc. XIX, como Tocqueville (1805-1859) e Stuart Mill (1807-1873), já apontavam que a principal ameaça da democracia é a tirania da maioria. Isso, porém, não os leva a renunciar ao governo democrático. Outra ameaça é a ingovernabilidade, ou seja, a incapacidade dos governos democráticos de responderem às demandas e resolverem conflitos em uma sociedade em que o poder está mais amplamente distribuído do que nos regimes autocráticos. Isso leva à sugestão de soluções autoritárias que tendem a reforçar o Poder Executivo, sobretudo em regimes presidencialistas.
Um exemplo é a discussão atual sobre a necessidade de um "poder moderador" convocado pelo Executivo, no caso as Forças Armadas (FA), para gerenciar o conflito do atual governo com o Congresso e o STF. Isso foi o que aconteceu em 1964, quando as FA deram um golpe para "salvar o país do comunismo". Na verdade, era um pretexto da alta burguesia para impedir as chamadas Reformas de Base do governo Jango. Não custa lembrar que foi assim que ficamos fora da democracia pelo mais longo período da República (21 anos).